Por Giselle Souza
Fonte Conjur
A exploração do amianto crisotila ou branco,
assim como a venda de produtos com esse componente, continua proibida no
Rio de Janeiro. O Tribunal de Justiça do estado julgou constitucional a Lei
Estadual 3.579/2001, que estabeleceu a vedação. De acordo com a
desembargadora Gizelda Leitão Teixeira, relatora do caso, o composto é nocivo
à saúde e os preceitos que visam a assegurar o bem-estar da população devem
se sobrepor a qualquer outro, principalmente os de ordem financeira. O voto
de Gizelda foi acompanhado de forma unânime, nesta segunda-feira (6/4).
O amianto é um tipo de fibra mineral comum na
fabricação de telhas, caixas dágua e pisos, entre outros produtos. A
discussão sobre o uso desse componente químico chegou ao Órgão Especial do
TJ-RJ em 2013, por meio de um incidente de inconstitucionalidade suscitado
pela 20ª Câmara Cível da corte, após dar início ao julgamento de uma apelação
interposta pelo Ministério Público do Rio. No recurso, o MP contesta decisões
da primeira instância que rejeitaram a ações civis públicas movidas contra as
empresas Eternit e Casalite Indústria e Comércio de Materiais de Construção.
Na ocasião, o desembargador Alexandre Câmara,
relator da apelação, verificou a existência de duas leis com posições
divergentes sobre a matéria. Uma delas é a Lei Federal 9.055/1995, que
autoriza expressamente, no artigo 2º, a extração e industrialização do
amianto branco, assim como a comercialização de produtos com essa composição.
Já a Lei Estadual 3.579/2001 proíbe — nos artigos 1º, 2º e 6º — a manipulação
e a venda de produtos feitos à base desse minério, em todo o estado do Rio de
Janeiro.
“Percebe-se assim um conflito entre a lei
federal, que expressamente autoriza o emprego do amianto branco, e a lei
estadual, que veda o expressamente após o decurso de prazo que já está
ultrapassado. Instala-se, assim, evidente conflito constitucional de competências
legislativas. Afinal, havendo conflito entre a lei federal e a lei local, só
uma delas poderá ser válida”, escreveu.
De acordo com o desembargador, uma decisão da 20ª
Câmara sobre o assunto violaria a cláusula de reserva de plenário, que veda a
decisão por órgão fracionado de tribunal que, embora não declare a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta a
incidência da mesma. Por isso, suscitou o incidente de
inconstitucionalidade.
Órgão Especial
Ao analisar o incidente, nessa segunda-feira, o Órgão Especial decidiu por
declarar a constitucionalidade da lei estadual — e, em consequência, a
inconstitucionalidade da lei federal. Ao votar, a relatora do caso destacou
que a exploração do amianto branco encontra-se proibida em mais de 50 países,
em razão dos danos que poderia causar à saúde. No Brasil, ela contou que o
uso do componente também foi vedado em diversos estados. Ela citou São
Paulo, Rio Grande do Sul e Pernambuco.
De acordo com a desembargadora, a indústria
continua a fabricar produtos com base nessa fibra mineral porque ela é
abundante e de baixo custo de exploração. Mas as consequências são as piores
para a saúde dos usuários. “O amianto causa uma série de doenças
incuráveis e progressivas, como o câncer do pulmão, da laringe e do aparelho
digestivo. O uso do produto representa risco a saúde humana. A lei estadual
está de acordo com os princípios inscritos nos artigos 196 e 225 da
Constituição. Urge-se priorizar os preceitos garantidores do direito à saúde,
que se sobrepõem a qualquer outro interesse, mesmo os de ordem financeiro”,
afirmou.
Supremo
A constitucionalidade da lei do estado do Rio que proíbe a exploração do
amianto e a venda de produtos feitos com esse minério também foi arguida no
Supremo Tribunal Federal. A ação foi ajuizada pela Confederação Nacional dos
Trabalhadores da Indústria (CNTI), em fevereiro de 2005. Inicialmente, foi
distribuída ao ministro Gilmar Mendes, mas em março de 2012 foi transferida
para o gabinete da ministra Rosa Weber. Segundo informações da tramitação
processual, o caso está concluso para julgamento desde o fim do ano passado.
Na ação, a CNTI alega que a lei fere o
princípio da livre iniciativa, expresso no parágrafo único do artigo 170 da
Constituição Federal, e viola o artigo 22, que estabelece como competência
legislativa exclusiva da União organizar, manter e executar a inspeção do
trabalho. Segundo a entidade, o amianto branco é utilizado em várias
indústrias brasileiras, que consomem 150 mil toneladas do produto por ano.
Essas empresas são responsáveis pela produção anual de mais de 160 milhões de
metros quadrados de telhas e um 1,5 milhão de unidades de caixas dágua.
Essa, contudo, não é a única ação em tramitação
no Supremo sobre o assunto. Diversas outras leis estaduais são questionadas
na mais alta corte brasileira. Em agosto de 2012, o STF promoveu
diversas audiências públicas para coletar subsídios para o julgamento das
demandas. Mas os julgamentos de algumas ações acabaram suspensos.
Muitas dessas ações têm como relatora a
ministra Rosa Weber. Ela também é responsável pelo julgamento da ação
direta de inconstitucionalidade contra a lei federal que autoriza a
exploração e comercialização do amianto em todo o Brasil. Este processo está
pronto para ir à julgamento desde janeiro deste ano.
Arguição de Inconstitucionalidade
0350430-60.2009.8.9.0001 (TJ-RJ).
ADI 4066 — Questiona a constitucionalidade da Lei
Federal 9.055/1995 (STF).
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